Um dos melhores trampos do ano passado de rap nacional na minha opinião, musicas de qualidade, boas bases e voz nervosa do mc Japão da banca do gog agora em trampo solo.
Confira a entrevista dada ao site bocada forte.
Bocada-Forte: Qual o motivo da escolha do título do CD "O alheio chora seu dono"? O que vocês quiseram transmitir com as imagens na capa deste trabalho?
Japão: O motivo da escolha do título veio de um ditado que minha mãe sempre falou pra mim e sempre levei como filosofia de vida, que significa que tudo que te foi negado voltará pra ti de uma forma pacifica ou não, portanto a capa retrata um pouco do sonho de quem mora nas periferias que precisa de melhoras e isso é privilégio somente dos poderosos.
B.F: Como foi o processo de composição das músicas e produção do CD?
Japão: Este CD foi produzido pelo conceituado DJ Raffa, as bases foram feitas em SP quando eu morava na zona leste. Em março deste ano viemos a Brasília para terminar todo processo e as letras foram escritas por mim de uma forma lenta, mas prazerosa, pois tive realmente de escrever uma obra com minha personalidade.
B.F: Ainda falando de produção, podemos afirmar que o Viela 17 reflete uma parte da realidade artística do Rap de Brasília?
Japão: Não só de Brasília, mas de um todo, morei em SP e adquiri muita experiência no mundo musical, então desta experiência juntei muita coisa para conclusão desta obra, coisa do cotidiano do Rio de Janeiro, São Paulo, do nordeste e do sul do país.
B.F: Fale sobre as participações de outros artistas do Rap neste trabalho.
Japão: Os convites foram feitos de uma forma tranqüila, o Brown, o Hood, e o Helião tinham firmado este compromisso no ano passado, no Hutuz, ai foi fácil o restante do processo.
B.F: O Rap é uma música dinâmica e passa por freqüentes inovações. Você acha que muitos grupos e artistas solos, em suas composições, estão virando as costas para a periferia e para a favela, apenas para se encaixar nesta dinâmica de modernidade ou a favela e a periferia já estão cansadas de ouvir o mesmo discurso?
Japão: Acho que inovação sempre foi válida! Apesar de ter muita coisa que ditam ao contrário, mas no meu trampo preferi falar do mesmo assunto que era falado, mas de uma forma tranqüila e dançante, acho isso uma inovação. Tem uma galera que viaja, mas isso é pra quem tem compromisso só com grana não com o povo.
B.F: O Rap banalizou a violência?
Japão: Violência já é uma coisa banal, acho que o Rap de uma forma concreta alertou a geral, mas uma minoria tentou se associar para dizer que o Rap é periférico, perigoso e bobo, mas os verdadeiros provaram que tem compromisso não só com o gueto, mas com o futuro de uma nação.
B.F: A influência do Gangsta Rap é muito forte em Brasília?
Japão: No Brasil todo se ouve este tipo de taxação, mas isso é uma irrealidade, o Rap de Brasília por sua forma é pesado e não gangsta, aliás não existiria uma forma gangsta em letras que só falam em necessidade de ser alguém, de ter um carro, isso significa necessidade, não expressão de poder como os gangstas norte-americano fazem.
B.F: Fica evidente a sua preocupação com a questão social. Suas letras falam da periferia e buscam transmitir a identidade e a união dos que vivem nos bairros pobres. Como entrar na mente e no coração dos manos e das minas? Seu Rap diz uma coisa, o mundão dita outra. A luta é injusta. A periferia pode mudar o jogo?
Japão: Só a periferia poderá mudar, tento a cada dia mostrar um mundo de paz, amor, romantismo e minha maior esperança é que a periferia consiga mudar mesmo que seja de bairro em bairro.
B.F: Como você vê a situação da mulher na periferia e na cena Rap?
Japão: As pessoas julgam as mulheres até por música, mas esquecem que mulher é a base de tudo, não daria pro Rap hoje estar se formalizando adulto se os caras não tivessem mãe, então acredito que as mulheres são, serão e nunca perderão o posto de chefe de tudo, aliás, hoje no cenário do Rap a cada dia que passa pintam mais mulheres com identidade própria, exemplo de Atitude Feminina do DF, a mina que canta com o Realidade Cruel de SP, Negga Gizza , Refém, Negra Ro do RJ, entre várias, que só não estão na música pra refrão, estão criando seu próprio estilo e estão até fazendo sua parte na área cinematográfica.
B.F: Muitos membros da classe média/alta pregam a mudança, mas não uma mudança que signifique a perda dos seus privilégios. Falam de combate a miséria, mas desde que esse combate não afete a essência de sua classe. Você acha que o Rap feito pelo playboy tenta se distanciar e não assimilar as idéias e conceitos que os prejudicam, que vão contra a sua razão de existência?
Japão: Acho que o Rap é música e música não tem classes sociais, pra mim existe Rap e modinha, Rap é pra todos que conseguem assimilar e tentar de uma forma ou outra mudar, se um playboy ouve Rap Nacional ele pode até querer tirar uma onda, mas tenho certeza que no coração dele cedo ou tarde despertará uma pequena revolução.
B.F: O Rap pode trazer de volta o jovem pobre que reproduz sem refletir o pensamento da elite?
Japão: O Rap é uma máquina de sonhos, que pode ser realizado ou virar pesadelo, sou de um tempo no qual os grupos tentavam ganhar território, hoje é pelo contrário, o Rap procura boites lindas, bons carros e um estilo que se não se cuidar jamais terá sustentabilidade.
B.F: Neste CD, na faixa "A morte chega como descanso", O Viela 17 critica a "axé music". Muitas pessoas que escutam esse som nos bairros pobres são sofredoras, trabalhadoras e tentam conquistar uma vida melhor para suas famílias. Por outro lado, muitos jovens ouvem Rap na periferia como se estivessem ouvindo "ciranda cirandinha" e não têm atitude e uma consciência política. Como você lida com essas contradições do dia a dia periférico?
Japão: Quando eu falo do axé não estou citando os tambores do Olodum que mudam de uma forma social a periferia deles, estou falando de um tal estilo chamado “swingueira”, que de uma forma retrata um homem machista que só pensa que mulheres são vadias e que a vida é uma festa, caso contrário do Rap que é ouvido e assimilado de uma forma singular não coletiva, em um micarê, os jovens querem viver o momento, beijar na boca e ser feliz, no Rap é diferente você muda com o tempo amadurecendo e respeitando o que é certo.
B.F: Qual sua opinião sobre o cenário Rap atual?
Japão: Acho que o Rap na sua fase adulta se diferenciou do Rap vivido na infância e adolescência na qual fiz parte, sinto falta de um MT Bronx, Tese Real, Geração Rap, Duck Jam e Nação Hip - Hop, mas acho que o Rap iria sim partir para mídia. Agora sim tem alguns despreparados que podem partir para um processo de destruição do que foi feito através de duros anos, mas tem muito cara bom e de caráter trabalhando para que isso não aconteça, o Rap foi o único movimento que partiu de uma estrutura sólida e concreta que resistiu por muitos anos e vai virar hit nos sentimentos dos mais experientes.
B.F: Num país com um alto índice de exclusão digital. Qual o papel da internet na difusão das idéias do Rap nacional? Elas chegam onde deveriam chegar?
Japão: Não, falta muito ainda. Acho que o sistema de digitalização será um dos maiores recursos para a divulgação do Rap nacional, tem vários irmãos que acham que isso não existe e procuram aclamar contrariamente em microfones que custam 2.500 reais, isso é foda.
B.F: Vocês têm contato com a grande mídia? Qual a relação do Viela 17 com a TV?
Japão: A grande mídia pra nós é o povo, o Viela não tem contato com nenhuma gravadora grande nem canais de TV, acho que isso é uma coisa, que pro Viela, é caso de se pensar. Farei tudo que for preciso com autoridade de 17 anos de Rap nacional, 6 CDs gravados para ajudar a periferia, mesmo que se for pra cantar no Ratinho. Acho que o Rap tem que ter contexto, não bobagem. Isso tem que ser passado pra quem está na frente da TV que é nosso povo, não milionário que nem vê TV.
B.F: O que seria "se vender" para o Viela 17?
Japão: Se vender pro viela 17 seria partir pro lado afundado das coisas, viver uma vida de ilusão pensando que o Rap é o meio de ganhar grana e que tudo que foi pregado passa a ser coisa do passado. Fora isso, acredito que ir pra uma gravadora com estrutura, subir num palco com um bom som e uma ótima estrutura não é se vender, pelo contrário é vitória pra quem só viveu migalhas desde que nasceu.
B.F: Deixe aqui suas considerações finais e, como sempre, uma idéia para os jovens que estão começando agora no Rap.
Japão: Em nome do Viela 17 agradeço desde já ao portal Bocada-Forte, por manter uma raiz revolucionária no estilo de difundir o Rap nacional, em especial ao Jair e ao Gil, e pra rapaziada deixo uma frase que me veio a cabeça:
Ter é poder, não ter se torna necessidade, não seja covarde de achar que seu sonho incomoda alguém, pois o coração periférico é a chave de ignição para a distância que insiste em virar cinza, quando nossos sonhos são coloridos.
Japão - Viela17
DJ Fabiano
Bocada-Forte: Há quanto tempo você é DJ? Como entrou no Viela 17?
DJ Fabiano: Sou DJ há três anos, antes eu era MC. O Japão me conheceu no Hutuz em 2003, trocamos umas idéias, na outra semana ele colou na loja que eu trabalho e me convidou para tocar com ele. Eu nem tocava, nem era DJ, mas ele me disse : “se você não sabe, aprende”. Ele tinha a idéia de fazer um disco solo, eu que dei a idéia de continuar o trampo do Viela 17.
B.F: Como vocês lidaram com o problema da distância? Você é de São Paulo, o Japão é de Brasília, como vocês mantinham e mantêm contato?
DJ Fabiano: O Japão morava perto da minha casa, na época da gravação do CD ele vivia na zona leste de São Paulo, mas a falta de tempo, o meu horário de trabalho e várias correrias nos afastavam. Então aprendemos e fomos obrigados a nos adaptar a essa realidade. Hoje nos falamos muito pelo rádio.
B.F: Como são os shows? Vai sair vinil do Viela 17?
DJ Fabiano: Meu, o barato é louco, tem gente que vê o show e acha que ensaiamos muito. Mas o barato é espontâneo, entre mim e o Japão existe uma sintonia imediata. Tudo é muito rápido, o lance tá no olhar, no improviso, no sentimento. É como um jogo de vôlei , ninguém olha pra cara de ninguém, mas a jogada sai certa, todos sabem pra onde a bola vai. Fazemos shows com MD. Futuramente teremos um vinil duplo do Viela, isso é um outro projeto.
B.F: Qual sua participação no CD?
DJ Fabiano: Bom, os scratches e colagens são do DJ Buiu, um irmão meu de confiança mesmo. Vou ser sincero com você, não tenho vergonha disso. O motivo foi que eu sabia tudo, tinha ensaiado, sabia das colagens, mas na hora em que fui gravar no estúdio eu fiquei nervoso. De repente, eu me vi num estúdio com um dos melhores produtores de Rap do Brasil, o DJ Raffa. Chegou minha hora e não saía nada. Sei que tenho muito que aprender, sei que estou me desenvolvendo e na hora certa vou fazer meu trampo de maneira natural.
B.F: O que você acha dos grupos que freqüentemente trocam de DJ? Você não acha que deve haver uma preocupação com a identidade e a interação entre DJ e MC?
DJ Fabiano: Meu, o que eu vou falar vale pra qualquer estilo musical: se você monta um grupo, uma banda, uma dupla, se você faz uma correria desde o começo, pense bem... Se sai um, acabou o grupo, acabou a origem, então monta outra parada, com outro nome. O cara escuta seu disco e no show vê que é outro cara que está tocando, isso é embaçado. Também acho que todos têm que falar no grupo, dar opiniões. No Viela 17 a gente discute direto, isso é para a melhoria, ninguém pode se acomodar, pra chegar num bom senso sabe... Volto a falar, se sair um acaba a parada, mas é complicado falar disso, é como se fosse uma família, acontecem várias tretas, várias fitas e quem está de fora não entende.
B.F: A cena Rap brasileira é enorme. Você trabalha em uma loja especializada em Rap Nacional. Quais são os estilos e grupos de Rap mais procurados?
DJ Fabiano: Em São Paulo, hoje em dia existe uma grande mescla. Os mais procurados são Racionais MCs, Facção Central, Realidade Cruel. Tem também os do Rap Underground, tipo o Slim, o Pentágono, tem até um que não lançou o CD ainda e é muito procurado, o Criolo Doido.
B.F: Você acha que o Rap às vezes é mal interpretado pelo jovem da periferia?
DJ Fabiano: A mensagem é forte em várias músicas e em vários estilos de Rap, mas acho que independentemente da música alguns caras da periferia já bebem, fumam e ficam caídos nos bailes, shows e festas. Os caras já estão acostumados a beber e a fumar, acham que os picos de Rap são lugares em que está tudo liberado. Talvez pela educação, pelo convívio com a falta de opção, mas isso não é só com o Rap.
B.F: A aparelhagem para DJ é muito cara, poucos têm acesso. Que mensagem você mandaria para um jovem pobre que quer ser DJ hoje?
DJ Fabiano: Bom, eu diria pra quem quer que seja, não precisa ser do Rap, não precisa ser DJ. Tenha um sonho, lute e viva seu sonho. Deus está conosco. Sonhar é o grande segredo. Sonho, força de vontade e fé, siga em frente.
B.F: Você acha que falta humildade na cena Rap?
DJ Fabiano: Falta muita. O Rap é feito pro povo carente, pro nosso povo. Existem outros estilos outras mensagens, mas vou falar do Rap feito pro povo carente. Ás vezes a molecada quer chegar no artista, vê o cara no palco e quer trocar uma idéia, pois o Rap fala pra molecada né não? Mas já vi vários caras, vários mesmo metendo mó mala, metendo marra, virando a cara pros moleques. Muitos dividem o camarim e ficam falando mal dos outros. Isso atrapalha, todos grupos tem que ter respeito e educação. Respeito um com o outro.
B.F: E as minas? Elas representam nos toca –discos?
DJ Fabiano: Tem várias. Tem a DJ Simone, tem a Lisa Bueno que detona, toca muito.
B.F: Pra finalizar, que CDs de Rap Nacional você indica para os leitores do Bocada Forte?
DJ Fabiano: O CD do Gênesis, um grupo gospel, O CD do Pentágono, O CD do Hood “Sujeito Homem 2”, O CD Do Apocalipse 16 “D’Alma” e principalmente o CD do Sabotage, sempre Sabotage.
Contatos: 0xx(61) 9901-1772 - 0xx(11) 223-0837 - 3338-2051
www.realhiphop.com.br/viela17
www.fotolog.terra.com.br/japaoceinorte
Fonte: www.bocadaforte.com.br